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2511 Nutricionista do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho/UFRJ. Especialista em Nutrição Oncológica pelo Instituto Nacional de Câncer.Especialista em Terapia Nutricional pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Membro do Comitê de Nutrição da Sociedade Brasileira deNutrição Parenteral e Enteral - Capítulo RJ2 Nutricionista do Instituto Nacional de Câncer/ HCIII. Membro do Comitê de Ensino do Instituto Nacional de Câncer. Especialista em NutriçãoOncológica pelo Instituto Nacional de Câncer. Responsável pelo Comitê de Nutrição da Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral -Capítulo RJTrabalho de Conclusão do Curso de Nutrição Oncológica do Instituto Nacional de CâncerEndereço para correspondência: P.C.P. - Rua Gramado, 475/202 Bloco C - Campo Grande - CEP: 23050-090. Rio de Janeiro- RJ. E-mail:patrícia_padilha@bol.com.brResumoO câncer de mama figura como uma das maiores causas de morbi-mortalidade em todo o mundo e, no Brasilapresenta-se como a neoplasia maligna mais incidente entre mulheres, assim como a principal causa de morte porcâncer. Diversos esforços vêm sendo realizados a fim de identificar os determinantes do câncer de mama, assimcomo os fatores protetores, e a abordagem terapêutica adequada. A literatura sugere que os fatores dietéticospodem contribuir para a carcinogênese mamária, portanto, a progressão e controle desta doença parecem estarrelacionados a hábitos alimentares, consumo de gorduras, carnes, produtos lácteos, frutas e vegetais, fibras,fitoestrógenos e outros componentes dietéticos. A importância da dieta na abordagem ao câncer de mama já éreconhecida, entretanto, os componentes alimentares quimiopreventivos necessitam ser mais bem fundamentados.Portanto, este trabalho teve por objetivo investigar, na literatura, o papel dos alimentos funcionais na prevenção econtrole deste tipo de neoplasia. A quimioprevenção, por meio dos alimentos funcionais, emerge como umpromissor instrumento no controle do câncer de mama, através de prováveis mecanismos de ação anticarcinogênicos,antioxidantes, antiinflamatórios, anti-hormonais, antiangiogênicos, dentre outros, embora as evidências científicassejam controversas, e fracamente sustentadas por estudos epidemiológicos. Dentre os compostos alimentaresestudados por sua ação quimiopreventiva no câncer de mama, os principais são: o ácido linoléico conjugado(CLA), os ácidos graxos poliinsaturados n-3, os fitoquímicos (isoflavonas, lignanas e outros compostos não-nutrientes),vitaminas e minerais. As pesquisas nesta área devem ser estimuladas, uma vez reconhecida a necessidade doesclarecimento sobre os mecanismos de ação destas substâncias alimentares.Palavras-chave: Neoplasias mamárias; Nutrição; Quimioprevenção; Alimentos funcionais.Revisão de LiteraturaAlimentos Funcionais no Câncer de MamaArtigo submetido em 27/01/04; aceito para publicação em 21/06/04Patricia de Carvalho Padilha1, Rosilene de Lima Pinheiro2O Papel dos Alimentos Funcionais na Prevenção e Controle doCâncer de MamaThe Role of the Functional Foods on Prevention and Control of the BreastCancerRevista Brasileira de Cancerologia 2004; 50(3): 251-260252Padilha PC e Pinheiro RLINTRODUÇÃOO câncer de mama feminino emerge como umadoença de importância cada vez maior em todas as partesdo mundo, por sua freqüência elevada e, principalmente,pela dimensão do problema, enfatizando a situação atualde morbidade e mortalidade da doença1,2,3.No Brasil, o câncer de mama figura como o maisfreqüente tipo de neoplasia em incidência e mortalidade,entre mulheres2,3. Assim, uma vez reconhecida a elevadaincidência e mortalidade do câncer de mama, aprevenção, assim como o controle deste, são de granderelevância, representando um importante problema desaúde pública2.O enfoque ao câncer de mama, na abordagem àsneoplasias malignas, justifica a realização de inúmeraspesquisas acerca de sua epidemiologia, fatores de risco,etiologia, métodos diagnósticos e, especialmente, sobreos fatores protetores e a abordagem terapêutica2.Dentre os fatores de risco para o desenvolvimentodo câncer de mama, destacam-se os aspectos ambientais,nos quais os fatores dietéticos são potencialmenteimportantes1. A literatura reconhece que os fatoresdietéticos representam cerca de 30% das causas decâncer, sendo somente superado pelo tabaco, como fatorde risco prevenível4.Portanto, a gênese e progressão do câncer de mamaparecem estar extremamente relacionadas a hábitosalimentares, consumo de gorduras, carnes, produtoslácteos, frutas, vegetais, fibras, fitoestrógenos, e outrosRevista Brasileira de Cancerologia 2004; 50(3): 251-260AbstractBreast cancer is one of the main causes of morbidity and mortality all over the world, and in Brazil it is showed asthe malignant neoplasm most incident among women, such as the main cause of death by cancer. Many effortshave been recognized to identify the determinanants of breast cancer, such as protector factors, and adequatetherapeutic approaches. Literature proposes that dietary factors may account for mammary carcinogenesis there-fore progression and control of this disease may be connected with people's diet, consumption of fat, meat, dairyproducts, fruit and vegetables, fibers, phytoestrogens, and other dietary compounds. The importance of diet onbreast cancer is recognized, although chemopreventive food compounds must be more studied. This study aimedto investigate, in the literature, the role of functional foods on prevention and control of this kind of neoplasm.Chemoprevention with functional food emerges as an important strategy to breast cancer prevention and control,suggesting mechanisms of anti-carcinogenic, anti-oxidants, anti-inflammatory, anti-hormonal, anti-angiogenic spec-trum among others, although scientific evidences are controversial and weakly supported by epidemiologicalstudies. The most studied cancer preventive food compounds related to breast cancer are conjugated linoleic acid(CLA), polyunsaturated fat acid n-3, phytochemicals (isoflavones, lignans and other non-nutrients compounds),vitamins and minerals. Researches about it should be stimulated, considering the fact that it is necessary to knowmore about these food substances.Key words: Breast neoplasms; Nutrition; Chemoprevention; Functional foods.componentes dietéticos5,6,7.Dados epidemiológicos e experimentais, quedemonstram uma associação entre dieta e risco decâncer, destacam certos componentes que têm umafunção quimiopreventiva, como alguns alimentosfuncionais, em especial no câncer de mama8,9.Considerando-se a relevância do tema, este estudoteve como objetivo principal investigar na literatura opapel dos alimentos funcionais no controle e prevençãodo câncer de mama, assim como analisar a utilizaçãodestes, e descrever seus principais mecanismos de ação.METODOLOGIAO presente artigo consiste em uma revisão doconhecimento disponível na literatura sobre o tema,utilizando-se os termos: quimioprevenção, alimentosfuncionais, nutrição e câncer de mama. Foramencontrados mais de 5000 referências nas bases de dadosMedline e Lilacs, porém optou-se preferencialmente pelosartigos dos últimos 10 anos, de língua portuguesa einglesa, e com ênfase para trabalhos epidemiológicos eestudos experimentais. Analisaram-se ainda manuais doMinistério da Saúde e livros acadêmicos.ALIMENTOS FUNCIONAISO binômio dieta-saúde representa um novoparadigma no estudo dos alimentos9,10,11. Neste contexto,surge a compreensão de que a alimentação adequadaexerce um papel além do que fornecer energia e253Alimentos Funcionais no Câncer de MamaRevista Brasileira de Cancerologia 2004; 50(3): 251-260nutrientes essenciais, enfatizando também a importânciados constituintes não-nutrientes, que em associação, sãoidentificados pela promoção de efeitos fisiológicosbenéficos, podendo prevenir ou retardar doenças taiscomo as cardiovasculares, câncer, infecções intestinais,obesidade, dentreoutras10,11.Deste modo, os alimentos que contém estaspropriedades são denominados alimentos funcionais,nutracêuticos, alimentos planejados e outros sinônimoscorrelatos. Entretanto, o termo que melhor se adequa àcategoria de alimentos fisiologicamente ativos é alimentosfuncionais, considerando que "cêutico" recordamedicamentos e "planejados" sugere artificial ou sintético10.O conceito de alimentos funcionais é amplo, edefende a suposição de que a dieta pode controlar emodular as variadas funções orgânicas, contribuindopara a manutenção da saúde e reduzindo o risco deacometimentos por morbidades11.Atualmente, o efeito funcional de um alimentoabrange não somente aqueles que, além do enfoquenutricional, exercem ações promotoras para o bomfuncionamento do organismo, mas qualquer alimentoou ingredientes alimentares benéficos para ofuncionamento orgânico11.A literatura referencia alguns critérios estabelecidospara determinação de um alimento funcional, tais como:exercer ação metabólica ou fisiológica que contribuapara a saúde física e para a diminuição de morbidadescrônicas; integrar a alimentação usual; os efeitospositivos devem ser obtidos em quantidades não tóxicas,perdurando mesmo após suspensão de sua ingestão; e,por fim, os alimentos funcionais não são destinados aotratamento ou cura das doenças11.Os principais alimentos funcionais são: fibras, ácidosgraxos poliinsaturados ômega 3 (n-3), fitoquímicos,peptídeos ativos (arginina e glutamina), prebióticos (inulinae oligofrutose ou frutooligossacarídeo), e os probióticos(lactobacilos acidófilos, casei, bulgárico e lactis)11.A ciência dos alimentos funcionais, apesar de bastanteestudada e evidenciada sua relevância clínica, aindarequer investimentos científicos para melhoresclarecimento dos seus princípios ativos e/ou efeitofuncional de alguns de seus componentes bioativos11.QUIMIOPREVENÇÃO NO CÂNCER DE MAMARecentemente uma atenção maior vem sendodirecionada à prevenção, visando reduzir a incidência emortalidade por câncer8,9. Deste modo, estratégiaspreventivas podem ser mais eficazes, pois a grandemaioria dos tipos de neoplasia maligna está relacionadaa fatores de risco preveníveis, entre eles os fatoresdietéticos9.Dentre as principais estratégias preventivas destaca-se a quimioprevenção, que surge como uma opçãoterapêutica, podendo prevenir, interromper, ou revertera gênese do câncer9.Neste contexto, entre as prioridades desta área depesquisa emergem a prevenção do câncer de mama, e autilização de alimentos funcionais como compostosquimiopreventivos8. Entretanto, a quimioprevenção comsuplementos dietéticos, vitaminas e minerais, esubstâncias não-nutrientes, os fitoquímicos, atuampotencialmente com mecanismos de açãoanticarcinogênicos, como os antioxidantes,antiinflamatórios, anti-hormonais, antiangiogênicos,dentre outros4,8,9.A literatura é unânime ao destacar a importância daintervenção dietética na prevenção e recorrência daneoplasia mamária12. Dietas baseadas no consumo defrutas, vegetais, grãos integrais e outras plantas parecematuar na prevenção e controle, minimizando o impactodo acometimento por esta patologia, em decorrênciade muitos compostos fitoquímicos, nutrientes ou não-nutrientes, que são excelentes agentes quimiopreventivos,freqüentemente encontrados nestes alimentos7.Rock e Demark-Wahnefried, em uma revisão deevidências relacionando nutrição e sobrevida apósdiagnóstico de câncer de mama, enfatizam os efeitosbenéficos dos fitoquímicos presentes na dieta, atravésdas atividades antioxidantes e sobre os hormôniosgonadais, na diminuição do risco de progressão destetipo de câncer13.As perspectivas futuras apontam para arecomendação de um plano dietético específico,destacando a importância dos compostosquimiopreventivos, ou seja, biologicamente ativos,presentes nos vegetais, que atuam na probabilidade dereduzir o número de casos novos e de reincidência dadoença. São necessários estudos clínicos randomizadosque possam contribuir significativamente para oentendimento dos mecanismos envolvidos naquimioprevenção, através dos compostos dietéticos, nocâncer de mama8,12,13.ALIMENTOS FUNCIONAIS NO CÂNCER DE MAMAOs agentes quimiopreventivos encontrados nosalimentos funcionais podem ser utilizados objetivandoum potente efeito preventivo, com múltiplos mecanismosde ação, bloqueando a carcinogênese9. Na abordagemao câncer de mama merecem destaque os ácidos graxospoliinsaturado ômega 3 (n-3) e linoléico conjugado, asfibras, algumas vitaminas e minerais, e os fitoquímicos.254Ômega 3 (n-3)Evidências científicas sugerem o papel promotor dagordura dietética no desenvolvimento do câncer demama e correlacionam o consumo excessivo de gorduracom o aumento dos índices desta neoplasia,especialmente na pós-menopausa 6,14, onde há maiorcorrelação entre o teor de gordura da dieta e os níveisséricos de estradiol 15.A maioria dos estudos sugere que a associação entrecâncer de mama e gordura é mais dependente do tipo degordura consumida do que da ingestão total desta 16,17.Contrapondo os fortes achados acerca do papelpromocional da gordura dietética na gênese dos tumoresmamários, estudos experimentais têm indicado que osácidos graxos poliinsaturados n-3, incluindo os ácidosgraxos a-linolênico, inibem a formação do câncer demama, assim como as metástases16,17,18.Considerando a variação entre o consumo dealimentos fontes de gordura entre os diversos países,nota-se uma tendência à redução das taxas de incidênciade neoplasia mamária naqueles cujo consumo de fontesde n-3, em especial, o óleo de peixe, são elevados, comonos países asiáticos14,15.Maillard et al. realizaram um estudo caso-controle,que avaliou a composição dos ácidos graxos no tecidoadiposo mamário de 241 mulheres com carcinomamamário não-metastático e de 88 pacientes com doençamamária benigna, a fim de investigar a hipótese de queos ácidos graxos n-3 protegem contra o câncer de mama.Como resultado, encontrou-se uma relação inversa en-tre risco de câncer de mama e os níveis de ácidos graxosn-3 no tecido adiposo mamário (RR=0,39; IC 95% 0,19-0,78; p=0,01). Portanto, o estudo evidenciou um efeitoprotetor dos ácidos graxos n-3 sobre o risco de neopla-sia mamária, e ressaltou o papel da razão n-3/n-6 nestetipo de neoplasia16.Dados de outro estudo caso-controle conduzido naFrança explorou a hipótese de que o ácido α-linolênicoseria capaz de inibir o câncer de mama; usando o tecidomamário como biomarcador do perfil qualitativo deingestão de ácidos graxos poliinsaturados, encontrouresultados semelhantes19, sendo o risco relativo de câncerde mama nas mulheres com alta quantidade deα-linolênico no tecido adiposo mamário de 0,36 (IC95% 0,12-1,02; valor de "p" = 0,026).A hipótese preferida para estabelecer a relação dasgorduras dietéticas com a carcinogênese mamária é ometabolismo dos ácidos graxos poliinsaturados20, queapresentam um papel importante na abordagem àsdoenças neoplásicas21.Os ácidos graxos poliinsaturados ômega 6 (n-6) sãoconvertidos a ácido araquidônico, que é precursor dasíntese de eicosanóides, denominados da série par, ouseja, as prostaglandinas2, leucotrienos4, e tromboxanosA21, cujas ações como importantes mediadoresbioquímicos envolvidos na infecção, inflamação, lesãotecidual, modulação do sistema imune, e agregaçãoplaquetária, estão diretamente ligadas aodesenvolvimento, crescimento e metástases tumorais14.Em contraste, os ácidos graxos poliinsaturados n-3são convertidos em ácidos eicosapentaenóico (EPA) edecosaexaenóico (DHA), que são precursores dosmediadores químicos, denominados prostaglandinas dasérie 3, leucotrienos da série 5, e tromboxanos A21.O EPA e o DHA bloqueiam a reação da desaturase,o primeiro passo para conversão de ácido graxopoliinsaturado linoléico (n-6) a eicosanóides da sériepar, responsável por mediar diversas funções, incluindoa proliferação celular, função imune, invasividade emetástasedo tumor14,22.Os ácidos graxos poliinsaturados são reconhecidoscomo importantes constituintes da membrana celular.Deste modo, o EPA e o DHA competem com os ácidosgraxos n-6, impedindo a incorporação deste à mem-brana fosfolipídica, e sua conversão a eicosanóides dasérie par, exercendo um efeito inibidor da proliferaçãocelular em linhangens de células cancerígenas do tecidomamário23.Finalizando, as evidências acerca do papel protetordos ácidos graxos n-3 no câncer de mama merecem sermais bem estudadas, especialmente com abordagensmetodológicas adequadas, assim como os seusmecanismos de ação, a fim de buscar compreendermelhor o papel destes ácidos graxos na carcinogênesemamária16,19,20.Ácido Linoléico Conjugado (CLA)O ácido linoléico conjugado (CLA) vem sendorecentemente estudado, reconhecido como umcomponente essencial para a boa saúde24.A literatura propõe que a atividade anticarcinogênicado CLA é evidente nas três fases da carcinogênese -iniciação, promoção e progressão25.A atividade anticarcinogênica do CLA na neoplasiamamária é evidenciada por inúmeros estudosexperimentais25,26,27,28, e experimentos in vitrodemonstraram que concentrações fisiológicas deste ácidograxo inibem o crescimento de células neoplásicas demama de maneira dose-dependente26,28.Durgam e Fernandes sugerem que o efeito do CLAno câncer de mama é decorrente de sua ação inibidorano crescimento de células mamárias denominadasRevista Brasileira de Cancerologia 2004; 50(3): 251-260Padilha PC e Pinheiro RL255receptoras de estrogênio positivas, ou seja, relacionadaao sistema de resposta estrogênica29.As propriedades antitumorigênicas do CLA na neo-plasia da mama relacionadas em modelos animais e emculturas teciduais não puderam ser confirmadas em umestudo prospectivo de coorte, incluindo mulheres comidades variando entre 55-69 anos, acompanhadas porpouco mais de 6 anos25.Os possíveis mecanismos responsáveis pela inibiçãoda carcinogênese pelo CLA incluem: a redução daproliferação celular, alteração nos componentes do ciclocelular, e mediação na inibição da apoptose. Além disso,o CLA modula marcadores do sistema imune e aformação de eicosanóides, atuando no metabolismolipídico e na expressão genética30.Certamente, o avanço das pesquisas abordando oCLA como possível mediador da tumorigênese mamária,especialmente através de estudos epidemiológicos, énecessário para esclarecer o seu papel na prevenção econtrole desta neoplasia30.FibrasAtualmente, inúmeras publicações têm levantado opapel da fibra na redução do risco de câncer de mama6,31,sugerindo que um aumento do consumo de fibras, ouseja, frutas, vegetais e grãos integrais, podem reduzir orisco deste tipo de câncer32.Muitos possíveis mecanismos de ação têm sidosugeridos, sendo o mais provável o que envolve a reduçãode estrogênios bioativos no sangue. É fato que dietasricas em fibras estão associadas com a alteração da floracolônica, atuando na regulação da recirculaçãoenterohepática de estrogênios, de tal forma que aquantidade de estrogênio excretado é aumentada31.Mecanismos alternativos ressaltam a importância deoutros constituintes da fibra, como o fitato (inositol-6-fosfato), que merece ter sua ação anticarcinogênicainvestigada, visto que há diversas evidências acerca davariedade de efeitos biologicamente significantes, natumorigênese quimicamente induzida31.Dados epidemiológicos muitas vezes não corroboramcom os dados experimentais. Talvez tal fato decorra dadificuldade na quantificação da ingestão de fibras, emdecorrência dos falhos instrumentos para avaliação doconsumo alimentar. Além disso, pesquisas em humanos,envolvendo o uso de hormônios, são complicadas devidoa grande variabilidade hormonal inerente às mulheresna pré-menopausa, e a difícil mensuração nas mulherespós-menopausa, onde a concentração de estrogênio éreduzida31,32.A hipótese de que o aumento do consumo de fibradietética pode reduzir o risco de câncer de mamanecessita ser mais bem compreendida e testada32.Vitaminas e MineraisEntre os micronutrientes mais investigados por suaatuação quimiopreventiva na carcinogênese mamária éimportante ressaltar as vitaminas antioxidantes, ou seja,as vitaminas A, C e E5,6,21, assim como o folato33, e oselênio6,34.Alguns estudos epidemiológicos são convincentes aodemonstrarem que mulheres com uma dieta rica emfrutas e vegetais têm um risco reduzido de desenvolveremcâncer de mama35. Entretanto, é ainda bastantequestionável se a aparente proteção de determinadosmicronutrientes pode ser parcialmente explicada peloconsumo de frutas e vegetais, cuja ação protetora con-tra a carcinogênese mamária tem sido evidenciada33.Uma das ações das vitaminas e minerais é a defesacontra as espécies reativas de oxigênio, que sãoresponsáveis por danos ao DNA, regulação dadiferenciação celular e, conseqüentemente, inibição docrescimento de células mamárias cancerígenas6.Considerando a vitamina A, o mecanismo envolvidona carcinogênese é incerto, porém, sua ação parece serreconhecida bloqueando a fase inicial e a promoção datumorigênese mamária, assim como atuando naregulação da diferenciação celular, prevenindo umaumento de células com características de malignidade22.Terry et al. realizaram um estudo coorte que nãosuportou a associação entre a ingestão de alguns tiposde carotenóides (α -caroteno, β-caroteno, β-cryptoxantina, licopeno, e luteína + zeaxantina) e o riscode câncer de mama, mas levanta a escassez de estudos,e a necessidade de se estudar a diversidade decarotenóides36.Assim, delimitando o papel da vitamina A no câncerde mama, é pertinente destacar outras propriedadesantimutagênicas e anticarcinogênicas de seusprecursores, os carotenóides. Por exemplo, a luteína eo α-caroteno podem inibir a atividade do citocromoP450, um ativador de pró-carcinogenes, e a β-cryptoxantina parece estimular a expressão de RB, umgen supressor tumoral e p73, gen relacionado à p5336.A vitamina E é também um potente antioxidante,sendo reconhecida por reduzir a incidência de tumoresmamários induzidos experimentalmente22.O α-tocoferol representa a forma da vitamina E commaior poder antioxidante e amplamente distribuída noorganismo, apresentando uma importante proteção con-tra a peroxidação lipídica nas membranas celulares37.Entretanto, não há um consenso entre os estudosRevista Brasileira de Cancerologia 2004; 50(3): 251-260Alimentos Funcionais no Câncer de Mama256experimentais e epidemiológicos, mas sugere-se umefeito potencial da ação antioxidante desta vitaminarelacionada a dietas ricas em ácidos graxospoliinsaturados, e alguns estudos investigando o papelprotetor dos ácidos graxos poliinsaturados n-3 associamvitamina E como um suplemento antioxidante22.A vitamina C (ácido ascórbico) tem seu possívelmecanismo de ação como bloqueador da carcinogênesemamária também baseado na defesa antioxidante6.Certamente, os dados de estudos científicos sãopoucos e controversos6, porém uma metanálise queavaliou o risco relativo de câncer de mama em 26publicações, de 1982 a 1997, evidenciou uma relaçãoinversa entre o consumo de vitamina C e risco relativodeste tipo de neoplasia (RR= 0,80; IC95% 0,68-0,95;p=0,02)35.Dentre os minerais supostamente envolvidos naredução do câncer de mama, o selênio é apontado comoum importante componente da enzima antioxidanteglutationa peroxidase6,15, inibindo diretamente aproliferação de células epiteliais pela degradação damatriz, o que resulta na inibição da angiogênese, eventoobrigatório para o desenvolvimento tumoral15.A relação entre o folato e o risco de câncer de mamatambém vem sendo bastante estudada, em especial, suainteração com o álcool, uma vez que o consumo deálcool pode aumentar os requerimentos destemicronutriente33.O folato está envolvido na síntese e metilação doDNA, sendo proposta a hipótese de que altas doses destenutriente podem reduzir o risco de vários tipos decânceres,incluindo o câncer de mama37.Os mecanismos pelos quais a deficiência de folatopode influenciar o processo de carcinogênese são:redução da metilação de DNA, que aumenta as taxasde mutações através da instabilidade genômica, pois ametilação é um importante modulador da expressãogenética; aumento dos erros na replicação de DNA; ehipermetilação de genes de reparo de DNA ousupressores tumorais, conduzindo ao desenvolvimentodo câncer38.Shrubsole et al. encontraram uma associação inversaentre o risco de câncer de mama e o consumo de folatona dieta (RR= 0,71; IC95% 0,56-0,92). Porém, oresultado mais expressivo foi encontrado entre aspacientes que ingeriam altas doses de co-fatores de folato,como a metionina, vitamina B6 e B12, demonstrando aação protetora do folato na neoplasia mamária, e queseus co-fatores podem contribuir para esse papel38.Em um trabalho com avaliação da utilização de mega-doses de vitaminas entre mulheres em tratamento decâncer de mama não-metastático, comparadas amulheres com o mesmo diagnóstico e mesma propostaterapêutica, porém sem suplementação vitamínica,observou-se um intervalo livre de doença menor no grupoque foi suplementado com polivitamínicos. A sobrevidaglobal foi similar nos dois grupos. Então, a utilização demegadoses de vitaminas não demonstrou eficácia naredução do número de mortes por câncer ou de novasrecorrências, do mesmo modo que não conferiu maiortempo livre de doença34.Assim, sugere-se a hipótese de que megadosesvitamínicas possam sofrer interação com os agentesquimioterápicos, recomendando-se a análise criteriosada utilização de megadoses de compostos vitamínicosem pacientes oncológicos, especialmente com câncerde mama34.FitoquímicosA quimioprevenção através dos fitoquímicospresentes na alimentação é bastante discutida9, e suaabordagem no câncer de mama comporta diversoscomponentes dietéticos15.No entanto, considerando os fitoquímicosrelacionados à neoplasia mamária, os fitoestrógenos, quesão compostos fenólicos heterocíclicos similares aosestrogênios naturais e sintéticos com propriedades tantoestrogênicas quanto antiestrogênicas15,24 são os maisamplamente investigados, sendo as isoflavonas e aslignanas seus maiores representantes15.As isoflavonas genisteína e daidzeína, obtidas da sojae de seus produtos, são as principais formasbiologicamente ativas deste fitoestrógeno39. Pesquisasexperimentais e epidemiológicas sugerem a hipótese deque as isoflavonas exercem um papel protetor nodesenvolvimento de tumores mamários39, em especialentre a população asiática40.Portanto, os mecanismos que sustentam taishipóteses baseiam-se na atividade estrogênica eantiestrogênica, onde as isoflavonas conjugadas,presentes nas plantas, vegetais e especialmente emprodutos da soja, podem ser desconjugadas pelasbactérias intestinais, permitindo que elas sejamabsorvidas para a circulação, onde podem competir, comestrogênios, por sítios de receptores estrogênicossituados nas células mamárias32. Em adição, asisoflavonas também são relacionadas com a alteraçãono metabolismo do estrogênio, convertendo o seumetabólito biologicamente ativo, 16-α-hidroxiestrona,em 2-hidroxiestrona, um metabólito menos ativo; coma alteração da quantidade de globulinas carreadoras dehormônio sexual (SHBG); e, por fim, com a atuaçãoRevista Brasileira de Cancerologia 2004; 50(3): 251-260Padilha PC e Pinheiro RL257como agonistas e antagonistas do estrogênio31.Outros prováveis mecanismos anticarcinogênicosvêm sendo investigados, como a inibição dastopoisomerases, regulação da progressão, diferenciaçãoe apoptose do ciclo celular, inibição da angiogênese emodulação do metabolismo, atuando como antioxidantese inibidores do metabolismo de carcinógenos24.Acrescentando, a alimentação a base de soja tambémé composta por outros componentes quimiopreventivos,como os inibidores de protease Bowman Birk,saponinas, lignanas, ácidos fenólicos e inibidores deprotease, que também parecem desenvolver efeitosanticarcinogênicos39,40.Evidências científicas relacionam a genisteína àinibição dos fatores de crescimento sérico e epidérmicode células mamárias normais, quando comparadas àscélulas cancerígenas. Deste modo, a ingestão de sojapode prevenir a iniciação do câncer, mais do que inibiro crescimento de células acometidas previamenteexistentes39.Os resultados acerca do efeito protetor das isoflavonasno câncer de mama são contraditórios, e existemalgumas evidências de que a genisteína e a daidzeínafavorecem a tumorigênese mamária, e in vitroantagonizam o efeito antitcarcinogênico do tamoxifeno,quando em baixas concentrações41.Hsieh et al. realizaram um estudo para avaliar osefeitos estrogênicos da genisteína no crescimento decélulas mamárias cancerígenas receptores estrogêniopositivas (MCF-7), in vitro e in vivo, demonstrando quea genisteína agiu como um agonista do estrogênio emambos experimentos, o que resultou na proliferação dascélulas malignas e aumento da expressão do gen pS2,que é estrogênio dependente42.Entretanto, em um outro estudo experimental, comcélulas cancerígenas receptores hormonais positivas(MCF-7) e negativas (MDA - MB - 468), evidenciou-seum declínio no crescimento celular inversamenterelacionado à concentração de genisteína, em ambosgrupos celulares, sugerindo um mecanismo de ação dosedependente, independente da relação estrogênica eantiestrogênica43.Diante das exposições acima, é necessário avaliar oefeito do consumo de alimentos fontes de isoflavonascomo terapêutica, em virtude dos seus possíveis efeitosadversos, obtidos especialmente em relatosexperimentais com baixas concentrações destas. Porém,estudos complementares devem ser estimulados44. Alémdisso, dados recentes não suportam a utilização desuplementação com isoflavonas15.As lignanas são compostos macromoleculareshidrofóbicos, cuja principal fonte é a linhaça, que têmsido relacionadas aos cânceres dependentes dehormônios, como a neoplasia da glândula mamária,devido à sua similaridade com o estrogênio45,46.A hipótese do papel protetor das lignanas no câncerde mama foi inicialmente sugerida em decorrência dadiminuída excreção urinária das suas principais formasativas (enterolactona e enterodiol) entre portadores destetipo de neoplasia e com alto risco de desenvolverem adoença45.A análise de um estudo experimental, com ratosexpostos ao dimetilbenzantraceno (DMBA), demonstrouo efeito anticarcinogênico das lignanas através de seuprecursor secoisolariciresinol, quando fornecidos noestágio inicial da promoção da tumorigênese45.Thompson et al. na discussão do trabalho referidoacima, identificaram alguns possíveis mecanismos deação das lignanas expostos pela literatura, destacando aação estrogênica/antiestrogênica destes compostos;redução da ação proliferativa de linhagens de célulasmamárias cancerígenas sensíveis ao estrogênio, quepodem estar relacionadas à habilidade da enterolactonae do enterodiol em inibir enzimas associadas com aproliferação celular, como a proteína C Kinase, ornitinadescarboxilase, e DNA topoisomerase; moderadainibição da aromatase, uma enzima envolvida naprodução de estrona, o que reduz as fontes endógenasde estrogênio. Além disso, as lignanas parecemdesempenhar um papel antioxidante, atuar naproliferação da vascularização de células endoteliais ena angiogênese45.Embora muitos relatos científicos, principalmenteos experimentais, sustentem o papel das lignanas naproteção contra o câncer de mama, estes necessitamser melhor esclarecidos45.A relação dos componentes alimentares classificadoscomo não-nutrientes e neoplasia mamária comportaoutras substâncias além dos fitoestrógenos, como porexemplo, os isotiocianatos, dialilssulfeto, 24 e indol-3-carbinol15.Os isotiocianatos, encontrados nos vegetaiscrucíferos, são abordados por alguns estudosexperimentais por sua ação quimiopreventiva do câncer,inclusive na carcinogênese mamária47. De uma formageral,esses compostos atuam inibindo o metabolismooxidativo de vários carcinógenos, que levam a danos noDNA, e várias linhas de pesquisas sugerem a ação dosisotiocianatos na fase II do metabolismo, o que resultana diminuição da toxicidade e aumento da velocidadedas substâncias carcinogênicas. Entretanto, existempoucos estudos esclarecendo a ação destes compostosRevista Brasileira de Cancerologia 2004; 50(3): 251-260Alimentos Funcionais no Câncer de Mama258alimentares especificamente na glândula mamária24.O dialilssufeto, presente nos vegetais do gênero allium,como a cebola, alho, alho-porró, e cebolinha,demonstrou inibir significativamente vários tipos decâncer, dentre os quais está o mamário. Os mecanismospropostos para a inibição da tumorigênese por essescompostos são pouco esclarecidos, e parecem estarenvolvidos com a capacidade de excreção de produtoscarcinogênicos24.Em uma recente revisão bibliográfica, relacionandonutrição e estilo de vida com o risco de desenvolvimentode câncer de mama, Gerber et al. apontam estudoslevantando a hipótese de que o indol-3-carbinol, presentenos vegetais do gênero Brassica, como o brócolis, podealterar o metabolismo de estrogênio, e aumentar a razão2/16-hidroxiestrógeno, determinante do risco de câncerde mama, uma vez que maiores concentrações de 2-hidroxiestrona são encontradas em mulheres comconsumo abundante destes vegetais, enquanto portadorasde câncer de mama têm elevadas concentrações de 16-a-hidroxiestrona15,48,49.CONCLUSÃOA relação dos fatores dietéticos com o câncer demama, e seus possíveis papéis como causadores efacilitadores deste tipo de neoplasia são amplamentereconhecidos pela literatura, embora não se encontremtotalmente esclarecidos.Diante deste contexto, a quimioprevenção atravésdos alimentos funcionais emerge como um importanteinstrumento na prevenção e controle do câncer de mama,sugerindo mecanismos de ação anticarcinogênicos,antioxidantes, antiinflamatórios, anti-hormonais,antiangiogênicos, dentre outros.Contrariando a maioria das evidênciasexperimentais, os estudos epidemiológicos sãoinconclusivos e/ou insuficientes na identificação do papeldos alimentos funcionais na prevenção e controle docâncer de mama.Por fim, os guias alimentares sugerem a adoção deuma dieta saudável e variada, rica em vegetais, frutas,grãos integrais, e sem excesso de gordura saturada, queofereçam componentes alimentares com possível efeitobenéfico na prevenção e na redução do risco derecorrência da neoplasia mamária. Desta forma,pesquisas nesta área devem ser estimuladas, uma vezreconhecida a necessidade do entendimento sobre osmecanismos de ação de determinados alimentosfuncionais na glândula mamária.REFERÊNCIAS1. Anelli A, Froimchuck MJ, Oliveira ML, Murad AM. Câncerda mama. In: Murad AM, Kats A. Oncologia: bases clínicasdo tratamento. 8a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan;1996. p.182-92.2. Instituto Nacional de Câncer. Falando sobre câncer demama. Rio de Janeiro (Brasil): INCA; 2000.3. Instituto Nacional de Câncer. Estimativas da incidência emortalidade por câncer no Brasil, 2003. Rio de Janeiro(Brasil): INCA; 2003.4. Key TJ, Allen NE, Spencer EA, Travis RC. The effect ofdiet on risk of cancer. Lancet. 2002;360:861-8.5. Willett WC. Goals for nutrition in the year 2000. CancerJ Clin. 1999;49:331-52.6. Willett WC. Diet and breast cancer. J Intern Med.2001;249:395-411.7. Thomson CA, Flatt SW, Rock CL, Ritenbaugh C, NewmanV, Pierce JP. 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